segunda-feira, 31 de maio de 2010

REMINISCÊNCIA

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Aos meus olhos de criança
Enorme era minha casa
O olhar não via
Por mais que desejasse
Onde acabavam paredes

Somente nas pontas dos pés
Era possível ver o que havia
Sobre o balcão da cozinha
De minha mãe

Aos olhos de qualquer um
Havia naquela casa
Muita gente comum

Tantas vozes, tantos pés
Muitos beijos e abraços
Um dia eu cresci
Encolhidas se tornaram
Todas as coisas e pessoas

Mudaram e como gente grande
Também assim me olharam

Sem nenhum aviso prévio
Arrebentou como tufão
De buscar longe dali
A aluvião de desejos


Quem dera...
Reaver dentro e fora
A beleza extinta, a união
Que um dia tive e perdi
Na minha casa.


Conceição Pazzola
17/5/2002

quinta-feira, 27 de maio de 2010

CHUQUETE

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Nossa cadela vira-lata acabara de morrer e eu ainda me sentia triste e saudosa, quando numa certa manhã de sábado o casal de franceses, donos da Gráfica Barthel onde meu marido trabalhava, apareceu de surpresa em nosso sítio. Ela com Chuquete nos braços como se carregasse uma criança. Botou-a no chão, me deu um abraço e contou que a cadela era sua, mas, morava num prédio em que não era permitido criar cães. Enquanto pequenina, Chuquete havia passado despercebida. Agora não dava mais para escondê-la. Crescera, fazia barulho e o jeito era eles se desfazerem dela. Dito isso, voltou ao carro, retirou os brinquedinhos de Chuquete, a coleira e uma caminha de cachorro. Jogou tudo no terraço lá de casa, depois de pouco tempo o casal de franceses foi embora. Nem esperaram que eu dissesse alguma coisa. Chuquete já cheirava a casa toda reconhecendo o território e se tornou minha companhia quando Giovanni saía de manhã pra trabalhar, só regressando ao anoitecer. Certa manhã, entretida na máquina de costura, não ouvi o portão da rua. O transportador de gás com o bujão às costas entrou repentinamente aos gritos, com Chuquete colada na sua perna. A calça rasgada, o homem soltava pragas contra o animal, sem entender que ela fazia seu papel de cão de guarda, protegendo-me. Não ouvi nenhum latido nem antes nem depois da saída do homem do gás.
Na primeira vez que Chuquete entrou no cio, ingenuamente Giovanni perdeu tempo construindo um galpão de madeira para protegê-la dos cachorros da vizinhança. Verdadeira matilha invadiu nosso quintal, em pouco tempo destruiram o galpão e entraram.
Meu marido passou a apedrejá-los, sem resultados. Até que um deles, justamente o cachorro de nossa melhor vizinha foi atingido por uma pedra e tombou. Apavorado, Giovanni foi buscar uma pá, cavou o buraco pra enterrar o cachorro de Dona Inácia. Antes que ele terminasse de cavar, o animal sacudiu-se completamenrte refeito e correu para sua casa. Melhor assim.
Quando vendemos o sítio, não foi possível levar Chuquete conosco. Ela deitou no terraço e ali ficou em silêncio, olhando-nos partir. Pouco tempo depois soubemos que Chuquete morrera de saudade de nós.




Conceição Pazzola
26/5/2010

sábado, 8 de maio de 2010

PARA SEMPRE

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Por que Deus permite

que as mães vão-se embora?

Mãe não tem limite,

é tempo sem hora,

luz que não apaga

quando sopra o vento

e chuva desaba,

veludo escondido

na pele enrugada,

água pura,

ar puro,

puro pensamento.



Morrer acontece

com o que é breve e passa

sem deixar vestígio.

Mãe, na sua graça,

é eternidade.

Por que Deus se lembra

- mistério profundo -

de tirá-la um dia?

Fosse eu Rei do Mundo,

baixava uma lei:

Mãe não morre nunca,

mãe ficará sempre

junto de seu filho

e ele, velho embora,

será pequenino

feito grão de milho.



Carlos Drummond de Andrade

TUDO BEM

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Tão pequena sou
No colo de minha mãe
Tão dificl era ter
A chance de deitar nele
A cabeça cansada
De pensar que
Nada mais vale
A pena
Como bem disse
Carlos Drummond
Mãe não devia morrer
Deixando filhos para trás
Sem o seu sorriso
Sem ouvir sua voz
Bálsamo na adversidade
Impossivel de preencher
Com outra voz
Mesmo se nada falasse
Seu olhar dizia-me que estava
Tudo bem.

Conceição Pazzola

sábado, 1 de maio de 2010

AMANHECER

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Pisei fora do portão, e naquele momento, a súbita ventania começou a varrer galhos e folhas das árvores desmanchando nuvens. A chuva de vento varreu o quintal de um canto a outro. Zeus, nosso hotwiler, correu para os fundos da antiga garagem agora vazia, enroscou-se sobre si mesmo para voltar a dormir enquanto o barulhinho dos pingos no telhado o embalavam. Dois passarinhos cinzentos de papo amarelo pousaram no murinnho da entrada, sacudindo asas e chilreando felizes com o inesperado banho de chuva logo ao amanhecer. Olhei o espetáculo da ventania e da chuva que varria o quintal em todas as direções e sentei para apreciar melhor. O dia apenas começava.