segunda-feira, 23 de junho de 2008
O PÉ DE TAMARINDO
Nas claras manhãs, mal o dia começa as almas saem a passear no sossego das ruas de meu bairro. As casas fechadas, os quintais desertos, os edifícios onde choram crianças pequenas e latem pequenos cachorros não as incomodam.
Está tudo mudado.
Do princípio da Rua João Ribeiro sumiu o lindo pé de tamarindo ou tamarineiro cujo tronco potente se alimentava da seiva colhida por grandes raízes, afloravam em côncavos convidativos ao descanso nas tardes quentes de verão.
Qualquer um gostaria de sentar um pouco, usufruir da sombra enquanto os frutos debruçados como flores pediam para ser colhidos.
Atrás do pé de tamarindo de quase três metros de altura escondia-se um casebre caindo aos pedaços, humilhado perante as moradias ajardinadas, cercadas por grades de ferro do restante da rua.
Parda é a vida quando se perde a esperança. Pardo e pobre ele poderia ser João, José, Benedito, o que importava senão sentar debaixo do pé de tamarindo a qualquer hora, dia ou noite com a sua garrafa. A vida transbordava em toda parte à sua revelia.
Bastavam-lhe o casebre carregado de silêncio e a árvore por companhia.
Mudava o cenário apenas quando a mulher encurvada armada de uma vassoura velha varria às pressas despejando algaravias em direção ao homem abraçado à garrafa.
Se filhos tinham pra que senão para enxergar a desesperança do casebre, o homem ao pé de tamarindo, a mulher encurvada?
Aos primeiros raios de sol religiosamente a mocinha regressava para recompor energias. Possuída pelo desânimo e nenhuma fé sequer um olhar ao imutável cenário.
Na clara tarde domingueira o homem encharcou os trapos, os cabelos e riscou o fósforo. Encharcado por dentro e por fora, dele sobrou o montinho de cinzas e nada mais a fazer.
Cortaram o lindo pé de tamarindo.
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3 comentários:
Assassinato de árvores. Na minha infância cortaram um grande galho de uma mangueira, que servia para que eu subisse nela. Foi umaleve fustração!!
Coincidência, tb tenho um conto relacionado ao tamarindo, mas se trata mais da bala!! hehee
E as árvores a marcarem as histórias de vida. Também tive uma importantíssima na minha infância: uma goiabeira.
Beijos, Ceiça!
Não diz a Bíblia que um abismo chama outro abismo? O assassinato da tamareira começou com a morte dos sonhos do homem do casebre, que sertamente começou com o descaso de todos ao redor. Mas a mesma Bíblia traz muitas palavras de esperança. Há sempre uma linda arvore marcando nossa vida, a própria tamareira é símbolo de renovação.
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