Durante o curto espaço de tempo de namoro ele não perdia ocasião de falar sobre o jardim onde deixara as melhores lembranças da terra em que nascera. O jardim da avó para onde fugia quando menino. Ela o ensinou a plantar e colher, a abrir massa, aprendeu também a fazer crochê e bordado e disso não se envergonhava. Com as sobras de massa modelava pombos, para provar que sabia retirava o miolo do pão, em poucos minutos os dedos ágeis mostravam que não haviam esquecido. O jardim para a liberdade absoluta, eu me perguntava como podia um jardim ser tão especial até compreender que falava do que chamamos o sítio, fazendinha ou roça.
Um dia levou-me a conhecer onde existira o inesquecível jardim de sua nonna. Ficamos abraçados de olhar melancólico sobre a região montanhosa, coberta de verde sem vestígios da casa ou do jardim.
Nos passeios pelo centro do Rio sempre dava um jeito de ficarmos sozinhos. Aproveitava para lembrar a infância feliz e a juventude atribulada na caserna. A guerra deixara marcas difíceis de esquecer.
Uma noite de verão na praça Paris, mergulhado em recordações, o rosto sério e o olhar distante divagava sobre o passado. Escutava-o refugiada em minha timidez quando ergueu o olhar, interrompeu o que dizia e começou a cantar, esquecido do lugar público e movimentado:
“Aveva um bávaro color zaferanno e na matina color ciclamino”...
Sorri sem compreender, ele tocou na gola branca sobre meu vestido vermelho e perguntou: Por que usa isso? Vai me esquecer para ser freira?
Imitei-o e o passeio prosseguiu assim, dois lunáticos, ele cantava primeiro, eu repetia sem entender nada até os nossos acompanhantes surgirem numa curva da praça repleta de casais.
Conceição Pazzola 30/10/2008
3 comentários:
Emocionante.
Ê saudade, querida.
um beijo
Nós te amamos.
Texto lindo, Ceiça. Emoção linda...comovente.
Um beijo, querida.
Postar um comentário