Era a primeira vez que nos separávamos, precisava deixar as crianças em casa de mamãe para a cirurgia inadiável e ele não podia se afastar do emprego novo.
Chegamos ao aeroporto depois de muita correria, quando as malas foram despachadas tivemos tempo para trocar um olhar e percebemos a falta que sentiríamos um do outro; vi os seus olhos se encherem rapidamente de lágrimas logo sumidas sob o punho da camisa de mangas compridas. Pigarreou, olhou em direção oposta e tentou falar com naturalidade:
- Talvez aconteça um atraso, vamos procurar um bom lugar para sentar?
Como em resposta ouvimos a primeira chamada na voz detestável e impessoal. Senti o seu braço enlaçar-me o ombro, despediu-se das crianças, deu-me um beijo apressado e correu em direção à escada:
- Siga
Aquela viagem haveria de ser rápida e perfeita, prometi aos meus botões.
Ocupamos nossos lugares, acomodei de qualquer jeito a sacola de mão com as mamadeiras, fraldas, água e todas as bugigangas de uso imediato.
O menino de dois anos tentava enxergar o pai pela minúscula janela, apontei em direção ao pontinho distante que agitava os braços freneticamente. Ele se pôs a berrar: Adeus, papai, Adeus, papai com toda a força de seus pulmões.
Os olhares de desagrado dos outros passageiros gelaram-me a nuca; o desconforto diminuiu quando saímos do chão.
Enjoei a viagem quase inteira, a comissária de bordo solícita proveu-me de saquinhos em razoável quantidade por três ou quatro vezes. Fiz força para não desabar em pranto, controlei o intenso desejo de voltar para casa, maldisse a falta que ele me fazia.
Tentei cochilar um pouco.
Quase despercebido o bebê escorregou, se pôs a engatinhar rapidamente entre as cadeiras; reinou constrangedor silêncio no interior da aeronave somente cortado pelo bate-bate irritante, ouvi comentários aqui e acolá abafados pelo barulho.
Com esforço superei o estado de letargia, antes de colocar em prática o desejo de levantar-me uma passageira apareceu ao meu lado com o bebê nos braços.
Depois de devolvê-lo para o meu regaço sem comentários sorriu, mostrou o penico rosa com o ursinho Poof em relevo preso entre os dedos. Matei a charada. Agarrei-o mais que depressa e escondi na maldita sacola.
Afinal as luzes do aeroporto surgiram à distância; respirei aliviada, a via-crúcis estava quase no fim.
Conceição Pazzola
Maio/2008
Um comentário:
"Marinheiro de primeira viagem"rsrs
Gostei da foto: O Recife é muito bonito. O texto é engraçado, e no mesmo tempo comovente, poetamiga!
Na minha opinião, você é uma grande escritora. Gostei demais!
Parabéns.
Beijos do,
Calvino
Postar um comentário